quarta-feira, 3 de março de 2010

Os planos educacionais brasileiros

*Texto enviado por Marilda Duarte. Confira na página da Revista Nova Escola.

As leis educacionais só se tornam realidade quando contam com o apoio coletivo dos envolvidos.

Por Juca Gil

Leis

Plano Nacional da Educação (PNE)
Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE)

(...)

A Educação, assim como outros setores, também sofre a influência de novidades que se sobrepõem. A tendência do momento é a multiplicação de planos educacionais, fazendo parecer que o volume maior de instrumentos de planejamento aumentará as chances de acertarmos o rumo das escolas.

O Brasil buscou, por mais de 70 anos, ter um documento que balizasse as ações em Educação nos estados em diversos níveis e modalidades. Após muitas tentativas, conseguimos. Está em vigor, desde 2001, o Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada pelo Congresso Nacional que abrange ações até 2011 (Lei nº 10.172/2001). Mesmo assim, o Ministério da Educação (MEC) lançou, em 2007, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), com intervenções previstas até 2022. Dois planos educacionais vigorando no mesmo país. Não é esquisito? Um dos argumentos do MEC para o fato é que o PDE teria como foco a qualidade do ensino, enquanto o PNE, a quantidade de ações. Vejamos exemplos de propostas inscritas no PNE:

"(...) 2. Elaborar, no prazo de um ano, padrões mínimos de infraestrutura para o funcionamento adequado das instituições de Educação Infantil (creches e pré-escolas) públicas e privadas, que, respeitando as diversidades regionais, assegurem o atendimento das características das distintas faixas etárias e das necessidades do processo educativo quanto a: a) espaço interno, com iluminação, insolação, ventilação (...); b) instalações sanitárias e para a higiene pessoal das crianças; c) instalações para preparo e/ou serviço de alimentação; d) ambiente interno e externo para o desenvolvimento das atividades (...) incluindo o repouso, a expressão livre, o movimento e o brinquedo; e) mobiliário, equipamentos e materiais pedagógicos; f) adequação às características das crianças com necessidades especiais.

3. A partir do segundo ano deste plano, somente autorizar construção e funcionamento de instituições de Educação Infantil, públicas ou privadas, que atendam aos requisitos de infraestrutura definidos no item anterior.

4. Adaptar os prédios de Educação Infantil de sorte que, em cinco anos, todos estejam conformes aos padrões mínimos de infraestrutura estabelecidos." (Lei nº 10.172/2001 - Item 1.3)

Fica fácil perceber que as determinações acima não mencionam quantidade e visam, sim, impactar a qualidade. Em minha opinião, o PDE atropelou o PNE, desconsiderando-o. Não foram realizadas as necessárias avaliações do PNE para a elaboração do PDE! Do mesmo modo, o PDE Escola, previsto para ser trabalhado como um instrumento de planejamento nas unidades escolares, passa por cima do Projeto Político Pedagógico (PPP) existente em muitas instituições. No lugar da busca para aprimorar os instrumentos, planos e projetos já existentes, há uma insistência na procura de novos caminhos sem que se faça ao menos uma avaliação da proposta anterior, verificando seus limites e suas fortalezas. Seria muito mais proveitoso se, no mínimo, ficassem claras as interrelações entre a novidade e aquilo que se pretende superar ou substituir. Em vez disso, o discurso governamental acena com a autonomia dos diferentes atores para fazer interpretações livremente e construir os nexos que bem desejarem. Mas será que o PNE e o PDE seguem a mesma lógica? O PDE Escola e o PPP apontam para um mesmo tipo de gestão? Eles são compatíveis? Se o debate não é enfrentado, deixa-se implícita a ideia de que prevalece a harmonia nas diferentes propostas.

Vale ressaltar que negar as contradições não as faz desaparecer. E isso só dificulta a vida de gestores que buscam formas de melhorar seu trabalho, juntando peças que não se encaixam. Ou pior, muitas vezes eles se sentem forçados a adotar propostas nas quais não acreditam ou que não entendem, pois não foram consultados em nenhum momento.

Essa reflexão é importante para compreendermos que uma boa ideia, na sua escola ou no Ministério da Educação, só se realiza se tiver apoio dos envolvidos e condições de concretização. Acordos mínimos são indispensáveis tanto quanto contar com recursos básicos. Do contrário, uma excelente proposta ficará apenas no papel. Precisamos fazer dos planos educacionais instrumentos de elaboração e implementação coletivas, desburocratizando-os. Ou eles estão a nosso serviço ou serão só documentos que cairão no esquecimento, ficando a Educação à deriva, tornando-se presa fácil das ondas de novidades e de ideias mirabolantes.

Juca Gil - É professor da Universidade de São Paulo e especialista em políticas educacionais.

Neste espaço, Juca Gil responde questões sobre legislação da Educação. Mande suas dúvidas.

Sugerido por:
Marilda Duarte
www.textoseideias.com.br
Celular 11 8259 9733

Fonte: Revista Nova Escola
Edição 005
Dezembro 2009/Janeiro 2010
Título original: Nossos planos
(no site: Políticas Públicas > Legislação> Todas as leis)

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